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Budismo, meditação e cultura de paz | Lama Padma Samten

"O fogo é a lucidez, a parafina é o samsara".

Pergunta feita ao Lama em 21 de agosto de 2021
Pergunta: Aquela metáfora que o Lama usa da chama do Darma que queima a vela, o Lama poderia falar sobre isso na relação com o refúgio, se a chama queima quando o refúgio está mais ou menos?
Lama: Eu estava trazendo uma imagem, que é assim: depois que a gente ouviu os ensinamentos é como se tivesse acendido uma vela, como se nós fôssemos uma vela acesa. Então, quando a visão aparece em nós, aparece essa chama da vela. E ela vai nos consumir até o final. Não vai sobrar nada. Essa é a questão. A gente pode até fugir, sair correndo. Quando sai correndo, a vela queima mais rápido. Se vier um ventinho, aquilo acelera. Se ficar bem quietinho, a chama vai um pouco mais devagar. Mas a chama vai consumir até o fim. Por quê? Porque essa chama é a lucidez, uma vez que a lucidez apareceu e já deu uma queimadinha aqui e ali, ela apareceu e começa a nos consumir totalmente. E ela vai consumir o refúgio. A pergunta é essa, né? Se consumiria o refúgio?
Pergunta: Na verdade, a pergunta é se a chama queima mesmo com o refúgio capenga.

Lama: Então, a pergunta é se a chama queima mesmo com alguns probleminhas no refúgio. A resposta é que a vela inteira são os problemas do refúgio. Ela vai queimar todinha. A parafina não resiste ao fogo. O fogo é a lucidez, a parafina é o samsara. O samsara não tem chance. As nossas fixações, as nossas existências, as nossas coisas não têm chance diante da lucidez. O que a gente pode aspirar é que dê um perfume quando queima. Às vezes dá um cheiro mais ou menos, dependendo de como a vela foi feita. É preferível uma vela perfumada. Mas que queima, queima. Ou seja, a iluminação total de todas as partes da vela significa o fim da vela. Aquilo vai acontecer, vocês podem ter certeza.
Pergunta: Wulstan Fletcher, tradutor do White Lotus, conheceu pessoas que fizeram dois retiros de 3 anos, tinham super conexão com o Darma e morreram sem conexão nenhuma. Como o Lama vê isso?

Lama: A pessoa só consegue se desiludir do Darma quando o Darma era uma ilusão. Quebrou a ilusão, ela se desiludiu. Porém, se a pessoa tem Visão, se a pessoa realmente compreendeu a vacuidade, olhou aquilo, viu a não-dualidade, nesse caso eu acho que não tem perdão. A pessoa não vai ter como. Mas no budismo, eu vi SSDL também dizer “vocês não fiquem tensos com isso, porque isso não é coisa de uma vida”. É assim. Não deu certo nessa vida, tudo bem, na próxima a pessoa não vem como praticante, mas vem como um varredor cuidando do jardim ao redor. Em casos extremos, vem como a Dudu, latindo pra cá, latindo pra lá. Mas ela está sempre aqui. Está sempre aqui dentro, diante da porta. Ela tem um refúgio numa dimensão. Esse é o problema. Mas eu acho melhor a gente retornar como praticante. E melhor ainda é consumir tudo durante essa mesma vida. Queimar tudo. Botar um ventilador e aquilo vai queimando as nossas confusões todas. Porque o Darma não é um clube. Não é alguma coisa que a gente tem que se filiar. Eu acho que a melhor forma de a gente entrar no Darma é de um modo crítico, ou seja, a gente vai criticando, encontrando problema. Esse é o caminho melhor, porque a gente avança porque não deu pra não avançar. Pensamos: “Isso aqui eu entendi, mas aquilo lá não está certo, aquilo não pode”. Assim nós vamos indo. Depois, inevitavelmente, quanto mais a gente protesta, mais o fogo ativa. E assim nós vamos avançando. Eu acho melhor assim.
Porém, se a gente seguir através de um processo que é um refúgio teórico, isso não vai garantir. Não garante mesmo. A gente precisa de um refúgio crítico. Olhem o Ananda, ele está sempre ali complicando a vida do Buda: “Mas Abençoado, e se isso e se aquilo”. Ele está lá complicando. Isso é super importante. As perguntas são importantes. A dúvida também é uma forma de caminhar. Se a gente não estabelece uma clareza crítica, quando a gente ouve alguém criticando, a gente está sem alternativas. Porque a gente pensa: “ué, mas como, eu não tinha pensado nisso. Vai ver que é”. Assim nós estamos frágeis. Quando os obstáculos aparecem diante de nós, nós estamos frágeis. Os obstáculos purificam a nossa prática.
Uma vez eu visitei, acho que foi lá por 1988, um erudito budista de São Paulo, que era muito amigo do Celso Marques. Eu fui lá visita-lo. Ele tinha uma parede enorme coberta de livros do Darma. Ele dizia: “Desperdicei a minha vida, tomei o rumo errado, eu deveria ter casado, deveria ter tido filhos, deveria ter feito outra coisa, aí sim eu estaria feliz”. Hahahaha! Na época eu não conseguia rir ainda. Então eu deixei aquilo assim. Mas esse é um ponto importante.
Então, se a pessoa aspira seguir pelo Darma para obter resultados dentro do samsara, ela vai se desiludir. Porque o samsara é o samsara. Mas se a pessoa procurar o Darma buscando a liberação, mesmo que ela não tenha a liberação completa, ela vai atingir vários níveis de liberação e aquilo vai realmente ajudá-la.
Para a pessoa não ter mais retorno, ela tem que estar do 7º bhumi em diante, 8º bhumi. A pessoa entende o Sutra do Diamante inteiro, as seis perfeições. Isso corresponde aos seis primeiros bhumis. No sexto, a pessoa entendeu, mas ela não tem aquilo presente o tempo todo, ela não tem a lucidez presente o tempo todo. No sétimo, a pessoa liga aquilo sempre que precisa. Mas às vezes a pessoa não consegue ligar na hora que precisa ligar e então afunda. No oitavo bhumi, a pessoa não desliga e aquilo vai queimar até o fim, com certeza! Mas quando a pessoa entendeu e não atingiu a realização ainda, aquilo está lá. Aquilo segue queimando. Porque a pessoa se afasta, briga, nega, mas quando ela nega, ela está negando aquele conteúdo. Aquele conteúdo ficou relevante. Ela não tem mais como apagar aquele conteúdo. Ela pode protestar e se opor, mas ela não consegue apagar. Com o tempo, a pessoa vai amadurecendo dentro daquilo e sua vida vai ficando mais nítida, mais lúcida, mais benigna para todo mundo ao redor, a pessoa vai desenvolvendo um outro nível de compreensão.
Eu olhando para vocês aqui, não escapa ninguém. É só relaxar, calma. E aí nós vamos… Se vocês chorarem, molha o pavio da vela, mas não apaga.
Transcrição: José Benetti
Revisão e edição: Stela Santin
Para assistir ao vídeo do Lama respondendo a pergunta, acesse:


 

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