“Os fenômenos que surgem por originação dependente são designados como vacuidade. […] Como não há nada que não surja por originação dependente, não há nada que não seja vacuidade.”
—Nagarjuna (Mūlamadhyamakakārikā | Versos fundamentais do caminho do meio)
Trechinho de um ensinamento de Lama Padma Samten no último dia do retiro “Originação dependente e os cinco lungs”, em Araras (junho de 2016)
As pessoas que estão imersas nas bolhas correspondentes, olhando para os seres com certo olhar, não têm a sensação de que aquele olhar constrói alguma coisa. Quando a gente entende que aquilo está sendo construído, ao mesmo tempo a gente entende que aquilo é rígido, real, e ao mesmo tempo a gente entende que aquilo é vacuidade, que a pessoa não precisa obedecer àquilo.
Então, a compreensão da origem dependente é crucial porque ela trabalha a vacuidade de modo dinâmico. Eu não preciso nem falar de vacuidade, eu só falo da originação dependente. Aquilo que surge pela originação dependente é vacuidade, é vazio. Mas quando eu falo sobre o vazio daquilo, eu não estou negando a objetividade e a operacionalidade daquilo. Aquilo opera, só que opera como uma maldição, porque a pessoa fica presa dentro daquilo.
Aí eu tento localizar: quando é que aquilo começou? E eu não consigo. Mas aquilo está operando. De onde é que aquilo começa e por que aquilo começa e quem é que começou (se é que teve alguém), qual foi a situação e o desequilíbrio que deu origem… Isso tudo é psicanálise, não importa. O que importa realmente é que nós temos a liberdade frente àquilo, vocês entendem? Nós temos a liberdade. Esse é o ponto! Nós precisamos localizar essa liberdade.
E como é que eu localizo a liberdade? Eu localizo na própria construção, porque quando eu construo eu estou manifestando a liberdade. Se eu pude construir uma coisa limitada, eu posso construir uma coisa maior, do mesmo jeito. Quando contemplamos a prisão, nós contemplamos o processo pelo qual a prisão se estabeleceu. Quando eu contemplo o processo pelo qual a prisão se estabeleceu, eu contemplo outras possibilidades, outras bolhas. Quando eu contemplo a multiplicidade de bolhas possíveis, eu estou contemplando a condição de liberdade incessantemente disponível. Eu não acho possível nós produzirmos uma transformação social sem isso.