Ensinamento precioso de Lama Padma Samten no finzinho da palestra de início de ano, após as preces de dedicação (1º de janeiro de 2015, no CEBB Caminho do Meio):
“Como é o critério de qualidade para sabermos se estamos efetivamente avançando ou não?
Um dos aspectos é o surgimento da compaixão e da energia natural associada à compaixão.
O outro aspecto do critério de qualidade é mais sutil, mais difícil de ver: é a perda da importância de nós mesmos, uma progressiva dissolução da noção de que somos nós que estamos fazendo alguma coisa — ou que seja qualquer ser de qualquer outro lugar que esteja emanando para nós.
Nós vamos descobrir esse aspecto misterioso na natureza primordial. Dentro desse aspecto misterioso não há as identidades, por isso que o Buda disse: “Se alguém olhar para mim e disser que sou um Buda, ele é um herége (ele não está vendo, ele está imaginando que o Buda é um fenômeno, é um ser, é alguma coisa pontual em algum lugar).”
Na medida em que vamos compreendendo e operando a partir da natureza primordial, nós vamos nos livrando do autointeresse. Vamos nos livrando da sensação de que tem alguém super especial que aprendeu não sei quantas coisas, que então é isso ou aquilo… Nós podemos ultrapassar isso. Então esse é um critério de qualidade que podemos observar em nós mesmos.
Com isso, não quero criticar, só estou trazendo esse aspecto. É natural que durante um longo tempo a gente também observe o aspecto extraordinário da gente mesmo ter surgido — com os nosso condicionamentos, dentro do caminho, podendo fazer boas coisas.
Mas tem um certo momento em que vamos perceber que as qualidades não são nossas. Elas não tem dono. As qualidades como compaixão, amor, alegria, equanimidade, generosidade, moralidade, paz, energia constante, concentração, sabedoria, nos seus múltiplos níveis, elas não são de alguém.
Quando muito, nós manifestamos o nosso corpo humano como um lago que pode refletir essas qualidades. Essas qualidades estão dentro de um ambiente que não é pessoal. Elas podem surgir como um reflexo. Que a gente seja um bom lago — sereno, que possa refletir isso.
Quando o nosso lago evaporar tem muitos lagos que podem refletir a lua do céu. Não pensem “Que grande perda vai ser esse lago desaparecer…”. A nossa alegria é a multiplicidade dos lagos de tal forma que a lua possa se espelhar.
Então, quando nós olhamos mais nessa direção a gente pode ter a sensação de enfim estar andando. Se a gente pensar “Eu estou andando, alô mamãe!, agora tenho certeza de que eu estou andando”, aí também já não está andando. Qualquer coisa que a gente estiver imaginando e retornando à noção de identidade, a gente está se iludindo. É super importante manter isso aberto, manter amplo.
Nós somos muito pequenos enquanto expressão. O melhor que nós podemos fazer é jogar essa pequena gota de volta para o mar. Imersos nessa amplidão, isso funciona de modo estável e permanente, além do tempo, além da origem.”